Intervenção na íntegra:
“Na passada terça-feira, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e o Governo chegaram a entendimento em relação à prorrogação do prazo para a transferência de competências da ação social para as autarquias, para abril de 2023.
Para além da prorrogação do prazo, o Governo vai transferir mais 35 milhões de € do que o que estava inicialmente previsto, dado que foi feita uma revisão total do financiamento das novas competências a descentralizar – estavam previstos cerca de 56 milhões de €, e agora estão previstos cerca de 91 milhões de €, o que representa um acréscimo de 38,5%.
Finalmente, foi estipulado o rácio de 100 processos familiares de rendimento social de inserção por técnico, e de 250 processos de atendimento de ação social por técnico.
Para o Município de Coimbra, esta decisão peca apenas por tardia, dado que desde que tomámos posse que vimos alertando o Centro Distrital da Segurança Social, a Sra. Ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, bem como os Srs. Secretários de Estado da Segurança Social e da Inclusão, que as verbas previstas para a descentralização da ação social para o Município de Coimbra são claramente insuficientes, para além de algumas incongruências, que passamos a explanar:
– No Decreto-Lei nº 55/2020, de 12 de agosto, que concretiza a transferência de competências para os órgãos municipais e para as entidades intermunicipais no domínio da ação social, no art.º. 3º d) é referido que é competência dos órgãos municipais implementar atividades de animação e apoio à família para as crianças que frequentam o ensino pré-escolar que correspondam à componente de apoio à família nos termos do art.º. 12º. No entanto, esta já é uma competência transferida para as autarquias através do Dec. Lei nº 21/2019, de 30 de janeiro, que concretiza a transferência de competências para os órgãos municipais e entidades intermunicipais no domínio da educação, presente no art.º. 39º a) – que menciona que compete às câmaras municipais promover e implementar medidas de apoio à família e que garantam uma escola a tempo inteiro, designadamente atividades de animação e apoio à família, destinadas a assegurar o acompanhamento das crianças na educação pré-escolar antes e ou depois do período diário de atividades educativas e durantes os períodos de interrupção destas. Ora, andamos a transferir competências que já foram transferidas?
O Dec. Lei está pejado de inconclusões – preconiza-se a transferência do serviço de atendimento e ação social sem que se estabeleçam rácios para os recursos humanos, o mesmo se passa em relação à celebração e acompanhamento dos contratos de inserção dos beneficiários de RSI – note-se que, e reforço, temos vindo a alertar a tutela sobre estes problemas, sobretudo desde final de junho, data em que estabelecemos a comissão de acompanhamento da descentralização.
Debrucemo-nos agora sobre as verbas a serem transferidas e sobre a caracterização do Município.
Em dezembro de 2021, o número de casos RSI no concelho de Coimbra era de 1814, e o número de SAAS 5694. Logo, de acordo com a nova proposta, deverão ser transferidas verbas para 41 técnicos.
Congratulamos (e aguardamos os pormenores do acordo para Coimbra) a nova negociação, que preconiza a criação de uma nova rúbrica relativa aos custos de instalações e funcionamento. De facto, para integrar mais técnicos na Divisão de Ação Social será necessário mais espaço.
Segundo o orçamento do Estado para 2023, a verba a ser transferida para o Município de Coimbra será de 696.472€, sendo que nas reuniões da Comissão de Acompanhamento nos foi transmitido que a esse valor acresceriam 50.000€ da transferência dos Centros Comunitários – no entanto essa informação não nos chegou por escrito, pese embora a nossa insistência por e-mails (que nunca tiveram resposta). Este valor é claramente insuficiente, pelo que aguardamos os valores a serem transferidos, tendo em conta o novo acordo.
Gostaria só de realçar aqui a verba que contempla os subsídios eventuais – 66.173€ – este encargo que contempla apoios pontuais a agregados, credenciais para farmácia, apoios para casos de emergência social, é claramente insuficiente, ainda mais com os cenários sociais e económicos apontados para 2023. Este valor carece de ser atualizado todos os anos, tendo em conta a situação económica do país. Saliento também que ultimamente, todos os dias nos chegam – à Câmara Municipal de Coimbra e às Comissões Sociais de Freguesia – pedidos de ajuda e de apoio de munícipes.
De facto, a descentralização de competências da ação social terá de ter em conta a atualização das necessidades dos munícipes e de preços. Para o ano de 2023, com a crise e inflação esperadas, certamente que os apoios e subsídios eventuais irão disparar.
A descentralização das competências da ação social tem de prever estes períodos, nos quais a intervenção social é fulcral e não pode ser de maneira alguma, mais um encargo para as autarquias, como tem sido a descentralização de competências da educação.
Este processo tem estado, e perdoem-me a expressão, enguiçado, dado que já foi prorrogado por duas vezes – de 1/4/2022 para 1/1/2023 e agora para 3/4/2023, as verbas eram claramente insuficientes e aguardamos agora, com alguma ansiedade se me é permitido, a atualização das mesmas.
Efetivamente a política de proximidade, através dos serviços de proximidade é benéfica para as autarquias, mas sobretudo para os munícipes, desde que acompanhadas por um pacote financeiro capaz de apoiar e auxiliar quem à ação social recorre.”