17 Dezembro 2024

CM de Coimbra quer classificar painel de azulejos de Vasco Berardo no Café Mandarim como interesse municipal

CM de Coimbra quer classificar painel de azulejos de Vasco Berardo no Café Mandarim como interesse municipal

A proposta de início do procedimento para a classificação do painel de azulejos da autoria de Vasco Berardo, instalado no café Mandarim, como Bem de Interesse Municipal, bem como a realização de um inventário da vasta obra de Vasco Berardo, com o intuito da sua eventual classificação, conservação, preservação e valorização futura, foram aprovados na reunião de Câmara de dia 16 de dezembro. Isto depois da CM de Coimbra ter sido notificada do arquivamento por parte da Direção-Geral do Património Cultural do pedido de classificação de âmbito nacional.

A Direção-Geral do Património Cultural remeteu um ofício ao Município a dar conhecimento do arquivamento do pedido de abertura de procedimento de classificação de âmbito nacional do painel de azulejos, que existe no Café Mandarim. Nesse ofício, informa que a decisão é justificada pelo fato do painel de azulejos não reunir os valores patrimoniais inerentes a uma distinção como valor nacional. No entanto, considera que o bem imóvel pode merecer a classificação como Bem de Interesse Municipal.

 

Agora, a proposta que vai a Executivo integra o parecer da Direção-Geral do Património Cultural, de forma a justificar o início ao procedimento de classificação como Bem de Interesse Municipal. No referido parecer, é dito que esta obra de Vasco Berardo “representa inegavelmente um valor patrimonial com significativa importância a nível artístico, bem como histórico-cultural e social, como testemunho de uma época específica da arte portuguesa e de vivências e factos históricos de singular importância a nível local”.

 

Acrescenta que se evidencia por um lado a qualidade artística do painel, pela cor, pelo caráter da representação, pela presença do neorrealismo que se insere numa primeira geração dos modernistas portugueses, mas também pelo significado no contexto político e social de então. “Se tivermos em consideração os elementos essenciais para a fundamentação de um processo de classificação de um bem imóvel, nomeadamente os critérios gerais, de carácter histórico-cultural, estético-social e técnico-científico, e os critérios complementares, de integridade, autenticidade e exemplaridade, parece-nos que este painel lhes corresponde inteiramente”, é defendido.

 

Segundo o mesmo parecer, “ a sua importância a nível histórico-social e artístico, ao que se acresce o seu simbolismo e valor imaterial, como testemunho de uma época crucial em termos político-sociais, encontra-se interligada à figura de Vasco Berardo, artista de relevo, quer na cidade de Coimbra, que lhe valeu em 2010 a distinção com a Medalha do Centenário da República Portuguesa pela Câmara Municipal de Coimbra, quer a nível nacional e internacional, que lhe valeram outras distinções idênticas”.

 

Vasco do Vale Berardo de Andrade nasceu a 5 de novembro de 1933, em Coimbra, onde veio a falecer a 1 de julho de 2017. Fez a instrução primária na escola de Celas, e com apenas 12 anos de idade vai frequentar o atelier do Mestre José Contente (1907-1957), com quem teve aulas particulares, onde começa a aperfeiçoar as técnicas de desenho e gravura. Em 1946 ganha o 1º prémio de desenho no Salão Provincial de Educação Estética, e, nesse mesmo ano, começa a trabalhar na Estatuária Artística de Coimbra. Em 1948 vai trabalhar para uma fábrica, a Cerâmica de Souselas, onde irá permanecer até aos 16 anos, no sentido de se poder dedicar mais intensamente à cerâmica artística e de conhecer as técnicas utilizadas. Segundo as informações disponibilizadas, terão contribuído para o seu enriquecimento profissional os mestres Manuel Pereira, oleiro, António Vitorino, aguarelista, e o arquiteto Fernandes. Juntamente com outros jovens artistas, vai fundar o grupo denominado “Os Novos de Coimbra”, com os quais participará em várias exposições coletivas entre 1951 e 1956.

 

Após cumprir serviço militar em 1954, vai trabalhar no atelier do seu irmão José Berardo, realizando trabalhos de cerâmica, e colaborar na ilustração de poesia, bem como na capa de livros para a revista Vértice. Em 1956 realiza o seu primeiro mural cerâmico, de influência neo-realista, “Os Carregadores”, para os Estados Unidos da América, e em 1959, executa então o painel de azulejos para decorar o então Café-Restaurante Mandarim. Em 1961 abre a fábrica “Faianças Berardos”, em Taveiro, com o seu irmão Alberto Berardo, onde executa o seu primeiro trabalho em baixo-relevo para a residência do jornalista Rocha Pato. Em junho de 1962, devido às convulsões da época, é preso com um grande grupo de Coimbra. Esteve detido na PIDE, sendo depois transferido para Caxias, onde permaneceu três meses, e, finalmente, para o Aljube, onde continuou detido até dezembro do mesmo ano. Em 1965 surge a sua primeira exposição individual. E isso foi só o começo.

 

Quanto ao Café-Restaurante Mandarim, com projeto e decoração do arquiteto Carlos de Almeida, foi inaugurado em 1960. Para o mesmo, foi feita uma encomenda a Vasco Berardo, de um painel de azulejos de grandes dimensões, que foi executada pelo artista aos 25 anos de idade, entre 1959 e 1960.

 

Esta obra espelha a aprendizagem artística, a capacidade técnica e o percurso artístico dos anos iniciais da obra de Vasco Berardo, retrata uma época da evolução da pintura em Portugal, e apresenta, paralelamente, grande significado, quer para o ambiente político social conimbricense, quer mesmo como manifestação contra a ditadura vigente em Portugal. Tanto o Arquiteto Carlos de Almeida, como o artista Vasco Berardo, são presos pela PIDE, respetivamente em 1960 e em 1961/62, sendo que Berardo esteve preso durante sete meses.

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